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terça-feira, 27 de abril de 2010

Caminho oblíquo


Sofro uma espécie de explosão para dentro de mim

que me abre os caminhos inexplorados

e me avança aquelas partes escuras

quase sem passos marcados.


Me abro com a faca

até sair nas vísceras alguma coisa nítida

com sabor de coisa inteira.


Sofro uma espécie de alargamento interno

que me exprime os pedaços mais grossos

por buracos molhados do olho.


E aquela saudade das coisas que não foram

aparece pulando no peito

mais que sapo pulando na terra.


Sofro uma espécie iluminação poética

que me encanta até nos abandonos

onde os silêncios se sustentam com palavras.


Podia ter pedaços de flor

no colorido preto e branco da nostalgia.


Podia ter expressões de orvalho

no canto doce do meu choro.


Sofro uma espécie de estreitamento

que me comprime até eu chegar onde estou

e de repente rabisca na imaginação

tudo que eu inventei pra me conhecer.


sexta-feira, 16 de abril de 2010

Com tato


De repente num suspiro oco

as luzes permanecem apagadas sobre minha cabeça.


Meus pés ainda distantes do chão

tocam o vento.

Meu peito ainda marcado por sinais eternos

toca minhalma.

E toda aquela melodia cega

toca dentro de mim

como um pulso desenfreado.


Experimentar-se é também poético.


Eu vejo beleza

em tentar equilibrar-se na corda bamba

e degustar o tombo

até entrar em contato

com tudo que te preenche os espaços vazios.


É como cair do trapézio para dentro de si

sozinho.


Eu vejo beleza

naquelas coisas pequenas

que quase não significam nada

mas que de repente

te tocam,

te fazem chorar.


Numa lágrima salgada

derramo-me inteira

para fora de mim.


Experimentar-se é também poético.





quarta-feira, 14 de abril de 2010

Pequenez empoeirada


No silêncio de espaços pequenos

havia um colorido doce

que me aproximava de mim

e me pregava nas formas disfarçadas de nada

que singelamente eu transformei em rascunhos miúdos

daquelas coisas que ficam guardadas por dentro.


Entre um passo e outro

de caminhos desenhados na poeira dos móveis

eu rabisquei pedaços de significados inteiros

que só a memória iluminada dos vagalumes fluorescentes

pode trazer de volta num flash de sonho manso

espirrado por entre breves coisas secretas

que me revelam quase coisa nenhuma

esboçada por verdades e mentiras minúsculas

já empoeiradas e esquecidas

onde só o pulso escondido pode tocar

suave-mente.





quarta-feira, 7 de abril de 2010

Do lado de cá


É como se meus pés apalpassem o escuro

e com as minhas mãos no chão

eu tocasse na mudez do meu silêncio

gritada dentro de mim

por uma voz estranha.


É como se o cheiro da lágrima

cavasse um buraco oculto

escondido por entre as dores

que eu rabisquei de vermelho carne.


É como se a palavra

revelasse as coisas pequenas

que nos constroem

e como se o eco delas fosse meu esconderijo.


É como enxergar num poço espelhado

a escuridão que me abre pra dentro.



É como degustar meu próprio gosto: secreto e íntimo.





sexta-feira, 2 de abril de 2010

Ilusão nossa de cada poesia


Brindamos nossas palavras e versos

vomitados

berrados

esgoelados

a qualquer custo

como quem brinda um gole inteiro de si mesmo.


É como se as palavras existissem

para nos libertar de nós

mas por vezes

são elas que nos aprisionam a nós mesmos

nos amarram à tentativa infame

de traduzir em algum rascunho de papel amassado

algo que só cabe em nosso pulso acelerado

captado pela menina dos olhos dilatada

e extasiada por um segundo inteiro

o que palavra nenhuma consegue definir.


A verdade das palavras

é a própria ilusão

que damos a elas.


Misturamos nossos sentimentos

com a poesia

e deixamos nascer versos

que parimos de nós

mas não são nossos,

são além de nós

muito além.

E nós nos apoiamos neles

para mentir o que somos

pois somente com a ilusão da expressão

conseguimos desenhar nosso ser em versos livres.

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