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quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Primeira palavra



Não cabe em lugar algum
o fardo cascudo que o laço criou.

Antes era a ausência
depois foi a presença
hoje é o lugar cativo
onde presença e ausência
se encontram
se misturam
e se destroem.

A primeira palavra pronunciada na vida
se tatuou como a mais profunda ferida.

Núcleo estilhaçado
de tudo aquilo que não se esconde
e não se toca
mas se dilacera até o ventre.

O silêncio construiu o tamanho da dor
o nó na garganta construiu o sabor do amargor
por ora sabor de presença da ausência,
por ora sabor de ausência da presença.

Poderia se chamar vínculo mortal
mas na verdade é só o limite do silêncio.

Estandarte sangrento
que carrega consigo
as marcas de uma vida
onde abandono e carinho
tinham o mesmo nome.

Quase não posso escrever essas lágrimas
quase não posso chorar essas palavras.

Traduzir a dor em versos
não faz que voz alcance os ouvidos mais desejados
e os colos mais cotados.

Ao contrário,
o que a falta faz
mais uma vez se repete
se instaura
se inaugura na eternidade
e se expande para os mais diversos laços.

Fica aqui a fenda da falta:
falta do seio da vida
e as tantas outras faltas
que a vida tratou de ordenar.

Quase já não posso caber aqui,
onde o limite do silêncio
berrou.


quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Eu e o vento




As nuvens dançam aos meus pés
e o teto do mundo alcança a ponta dos meus dedos.

No jardim dos encontros
eu desenho um abrigo
faço dele meu esconderijo.

É como se das flores
restassem a cor
e das árvores
a sombra.

É como se de tudo
sobrasse aquilo
que nunca faltou.

Ficou no jardim
o encontro,
o abrigo,
as nuvens
e o teto do mundo.

Ficou em mim o meu desenho.

E com a ponta dos meus dedos
eu danço na cor da sombra da flor da árvore.



sábado, 5 de novembro de 2011

Onde os raios se transformam em sonhos




Manso e único era o sabor daquele tormento colorido
que coagula o sangue mais íntimo
e estanca no peito as reações pulsantes

O que desabrocha em mim tem uma outra cor
uma furta cor inocente
carimbada de alegria e dor.

Devagar brotam sonhos compartilhados
e futuros tricotados juntos para além do tempo.

Devagar os cachecóis aquecem os pescoços
e modificam cada pulsação absorvida.

É como um grito que desampara e ressignifica o som do poema
como se as palavras acordassem a poesia
criando vida e sonho nas pétalas dos versos.

E a vida se ocupa em surpreender os sentimentos
criando um desencontro fascinante
entre tudo aquilo que existe e tudo aquilo que se cria
onde os raios se transformam em sonhos.



sábado, 3 de setembro de 2011

Alegoria




É como um tapa na cara
manso e breve,
mas que deixa a sua marca
estampada na alegoria principal.

É o avesso do sonho
o inverso dos planos
é quase feito alguma coisa enorme
que não se parece a nada.

É o eco de uma voz solitária
a cantar seu pedido de colo
em momentos intervalados e constantes.

É o perdão nunca dado
e a mágoa nunca esquecida
que se misturam num gole inteiro
da dose mais forte
de amnésia forçada goela abaixo.

É só aquele toque
que quer ser ouvido como uma música interrompida
momentos à frente.

Tem um gostinho de abandono
essa melodia estapeada.


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