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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Quase conto sobre o amor


Ao meu amor partido que partiu e aqui comigo deixou lembranças doces e vivas e internas, como se amor fosse uma coisa nossa, não é, e jamais foi meu bem, amor é aquilo que nos pertence, mas que não pode ser nosso, amor é só do amor, e dura apenas enquanto durar amar.

Foi pensando que amar era coisa fácil, que eu comecei a colecionar cacos. Entre os mais belos guardei você nalgum deles (dentre outros tantos não menos belos). Seu rosto reluzia como uma vidraça limpa e eu me lembro muito bem como você olhava vitrines como quem olha dentro de si, parava e ali reparava cada uma, reparava cada parte de si no brilho delas, e só assim podia tocar-me, é que as vitrines é onde me escondia e onde escondeu a todos os que amou, você olhava vitrines como quem guarda as pessoas dentro delas, e só as toca até o vidro ainda brilhante, ainda limpo. E foi assim, que me tocou. Tocaste de um jeito singelo e calmo e manso, me olhou dentro dos olhos de um jeito profundo e deixou vazar algumas lágrimas como se escondesse algum segredo nelas. E ora, escondeste bem, meu bem. As pistas e passos que aqui ficaram não mais me conduzem à aquele toque e aquele olhar, mas me mostram dentro de mim um caminho vago que só eu sei percorrer.

O fim do amor é algo digno de brindes eternos e saudosos dignos das palmas mais representativas que podes receber. E partir não é simplesmente dar as costas e sair, é mais que isso, é deixar de si tudo o que deve ser deixado, e acredite, é tarefa árdua deixar um pouco de si num canto qualquer onde nem sequer sabes se vai saber encontrar novamente o caminho, e ainda é levar aquela parte pesada que mal podes carregar com os ombros já cansados e pesados e baleados. O mais difícil do amor é deixar de amar, esse sim é o impossível do amor. Improvável.

Amar é aprender partir com classe e deixar o outro partir como quem é expecta-dor de sua pobre e nobre dor. Deixar ir e saber a dor é o mínimo necessário para entrar em contato consigo através somente de si. E entra, deixe entrar, afinal é saboroso equilibrar energias e vê-las estáveis como nunca antes imaginaste. O sabor de sofrer tem um gosto bonito de se conhecer. E é assim, só assim, quando deixas partir e partes também que percebes que amar é muito além do que dura o amor, aquilo que sobra depois de tudo que partiu e ficou é ainda o amor, do jeito que ele devia ser antes mesmo de ter sido tudo isso.

Só assim que o sabor dos nossos sonhos, é enfim o sabor nosso, e não vai fugir, ficou guardado aqui com algum outro gosto, real.


Basílio Ferreira Filho

P.S.: uma face máscula de Fernanda Tavares

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Sem norte


Loucura e desorientação,

naquele cemitério de ilusões

encruzilhadas na mente morta,

pálida de confusão.

Sem cheiro, sem cor.

Com aquele gosto asco,

medo e nojo e dor.

Mãos trêmulas e frias e suadas

marcadas com sangue.

Sangue que veio da alma

escorreu do vazio que ela escondia de si.

Ela segurava aquele livro

como se estivesse dentro dele, presa ali

em algum lugar onde ela certamente não estava.

Seu corpo não mais falava,

era mudo e rouco

ela não tinha como gritar aquela angústia aprisionada em lugar nenhum.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Vago


A doce dose amarela de sangue escorrido, pálido e coalho

Feito versos perdidos

Lembranças brancas

Naquele azul que borbulhava cheiro de dor.

Abaixo o rosto e escondo-me em mim

Escondo-me de ti.

Tudo que já não pertence e ainda é meu.

Os furos da parede concreta levam ao teu silencio já esquecido

Como num naco de alma

Uma lua que ainda brilha no teu peito

Por trás do gosto nobre do corpo adormecido.

Como se os mortos falassem do que nunca sentiram!

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Sobre meu quase eu


Eu escrevo sobre o vazio.

Sobre o nada que sempre fui

E sobre a coisa nenhuma que preservo em mim.

Escrevo o que não sou.

Desato meus nós com palavras soltas

Mais vagas que eu mesma.

Desabafo meu silêncio

Num berro sem voz, sem cor.


Eu escrevo sobre a falta de eu em mim

Jogada ao vento nessas palavras sem sentido

Escrevo sobre meu anti eu

Sobre meu ego perdido no eco partido.

Eu mostro tudo o que não sou

Num retrato meu, que não me vi

Atiro minha parte guardada

Em qualquer gaveta cardíaca trancada, sem porta de entrada.


Eu escrevo sobre o tempo,

Maldito!

Aquele que passou e levou consigo uma parte do que era meu

Uma parte que era eu mesma.

Um brinde a minha possessão, só minha.

Duas doses com sal e limão.

Eu já não tenho nada mais a escrever

Sobre meu quase eu.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

A solidão das putas


Escrevo às putas abandonadas na margem da solidão,

Desfaleço-me toda por inteiro

Descrevo em mim o vazio dos seus corações

Limpo o corpo para o cliente derradeiro.

¨

¨

Vem!

Não vê eu ainda te espero?

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