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quinta-feira, 29 de maio de 2008

Hello stranger













Eu guardo comigo o passado e tudo aquilo que com ele passou. Eu passei.

Olho para traz e paro exatamente aqui, nesse passo, nem meio à frente. Paro aqui, para daqui olhar lá. Assisto todo o devaneio nostálgico e íntimo que por ser assim tanto é esconderijo de mim mesma.

Vejo no sonho interno cada pedaço de mim microscópico que nunca ninguém chegou perto. Sinto-me em mim, lá dentro sufocada de tanto me ser. Paro tudo. Quero morrer nessa overdose de ser que sou agora.

Sou, portanto, só isso. Sou cada pedaço que ficou, cada parte que nem não cabe mais, mas é só lá que sou. Nesse tanto de eu em mim, sou lembrança de ‘eu’, lembrança de mim…



Fernanda Tavares

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Macabéas em mim!


"Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o irreprodúzivel, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador. Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada."

[Clarice Lispector]

"Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. (…) A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior e não tem uma só palavra que a signifique. (…) quem vive sabe, mesmo sem saber que sabe. (…) Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados. (…) Ela sabia o que era o desejo - embora não soubesse que sabia. (…) A maior parte do tempo tinha sem o saber o vazio que enche a alma dos santos. (…) Só que precisava dos outros para crer em si mesma, senão se perderia nos sucessivos e redondos vácuos que havia nela."

[Clarice Lispector, em A hora da estrela.]

"O mundo inteiro teme a própria vida. A morte é coisa que não é nossa. Mas a vida, a vida é, e eu morro de medo de respirar."

[ Clarice Lispector ]

E no mais, eu me escondo nisso…

Nada além de esconderijo! :*

sábado, 24 de maio de 2008

Ah, Clarice!


"O que eu sinto, eu não ajo. O que ajo, não penso. O que penso, não sinto. Do que sei, sou ignorante. Do que sinto, não ignoro. Não me entendo e ajo como se me entendesse. É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de novo a mentira em que vivo. Suponho que me entender não é uma questão de inteligência, e sim de sentir, de entrar em contato… Ou toca, ou não toca. Terei toda a aparência de quem falhou, e só eu saberei se foi a falha necessária. Liberdade? É pouco. O que eu desejo ainda não tem nome. E se me achar esquisita, respeite também. Até eu fui obrigada a me respeitar."

Clarice Lispector

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Affonso Romano de Sant’Anna


Affonso Romano de Sant’Anna ( escritor mineiro )

A comunidade precisa matar o passado para ter alguma esperança no futuro.
A construção do silêncio exige muitas palavras. O escritor, por exemplo, constrói uma casa de palavras para ouvir seu silêncio interior.
A língua é a essência de uma nação (indígena ou civilizada). É o móvel de identidade psicológica e cultural. Por isso todo dominador começa por proibir e destruir a língua do dominado.
A moda é dinâmica, mutante, passageira. O costume é estático, duradouro e aspira à continuidade.
A poesia pode comover. A poesia pode fermentar a história. A poesia resiste e sobrevive às engenharias estéticas e genéticas.
A pretensão de todo poeta é ser um jornalista da alma humana.
A violência sempre esteve ligada ao poder. E a violência masculina é um exercício perverso do poder.
Amor é uma tarefa a dois e um aprendizado ininterrupto. É ele que dá sentido ao desejo e enraíza a paixão.
Cantor, poeta que fala do social e que socializa ele mesmo seu modo de produção estética, Chico Buarque, por outro lado, tem aquilo que deveríamos chamar de síndrome do Rei Midas: converte em sucesso tudo que empreende.
Compositor, teatrólogo ou romancista, Chico nunca se afasta muito dos seus temas prediletos: os marginais, os anti-heróis, os infelizes, os desvalidos. E sua defesa deles é tão inflamada e sincera que muitas vezes se confunde com profunda identidade.
Democracia não é apenas uma prática a outros delegada, senão algo que se pratica em todas as instâncias.
É no poder que se conhecem os verdadeiros democratas.
Em "Amanhã há de ser outro dia", esse outro dia de paz tem um sentido individual e social. É a paz entre os amantes, a paz entre o povo e seus dirigentes, é a paz entre os povos.
Falar uma língua estrangeira é romper uma fronteira. Falar muitas é romper várias.
Não se pode calar um homem. Tirem-lhe a voz, restará o nome. Matar, sim, se pode. Se pode matar um homem. Mas sua voz, como os peixes, nada contra a corrente, a procriar verdades novas.
O carnaval é basicamente um movimento diluidor da rebeldia.
O ceticismo é o barateamento de uma certa filosofia. O cético não vive, desconfia. Não participa, espia. Não faz, assiste.
O desejo pinta e some. A paixão explode. Já o amor é um desejo que se aprofundou e uma vivência intermitente da paixão.
O mistério começa do joelho para cima./ o mistério começa do umbigo para baixo/ e nunca termina.
Os mortos podem ajudar a ressuscitar os vivos.
Quem repete linguagem velha não está falando, está sendo falado. A linguagem é o homem e o lugar que ele ocupa no mundo.
Réu primário é como se estivesse dizendo que todo o mundo tem direito de matar alguém, inconseqüentemente, uma vez. Só depois é que se torna criminoso.
Sem o mito do amanhã não existiríamos. Não fora o amanhã e secaríamos à beira dos caminhos, esboroaríamos como um cascalho no deserto. O amanhã é que fermenta o hoje, que fermenta o ontem.
Toda vez que um oprimido reclama seus direitos, os outros oprimidos se sentem menos fracos.
Um homem não se cala com um tiro ou mordaça. A ameaça só faz falar nele o que nele está latente.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Breve verso









O sentimento move os versos,

mas não move o mundo.

O verso se carrega e se romantiza

o mundo não pára.

Todos sabem disso,

mas ninguém sabe de nada!


Fernanda Tavares

terça-feira, 20 de maio de 2008

Novalgina



Eu?! A falta de mim não sabe o nome que deram para responder quem sou eu.
Sinto. A falta de me sentir prova a necessidade dos sentimentos. Derramo-me neles, então. Sente-se? Sente-se.
Põe a vida para pensar. Pára e re-pára. Tanta falta faz tanta coisa. Remexer. Isso abre e reabre feridas e descobre as doloridas intactas deixadas guardadas lá atrás, onde talvez se fosse feliz como já não se é.
Tanto começo no meio dos fins. Falta de fim, falta de meio. Não, a pergunta não tem resposta. A resposta perde-se da pergunta na falta dela. Saber o sentido e buscar algum objetivo muito me interessa. Não saber, nem ter. Só isso.
Lá para o final do começo descobre-se a falta de sentir aquilo que nem nome não tem. No início do meio sabe-se que o fim já veio. Fim, dessa falta de ser.
Volto no início, que nunca não teve. Na procura indiscreta dentro de mim por algum vestígio do meu eu. Palmo a pequeno palmo encontro pedaços. Me encontro em pedaços. Só me interessa aquela felicidade que agora está no pedaço. No pedaço de cada pedaço por inteiro. Frio na barriga. Nostalgia. Novalgina.

Fernanda Tavares

Labirinto Particular


Fica-se tudo. Fiquei para traz, perdida em algum lugar do passado, em algum pedaço de ser que me era inteiro. Veio comigo o vazio, que caminha ao meu lado e não me deixa sentir solidão. O eco pesa no vazio e nas indagações que me preenchem sem sobrar espaço algum.

Escrevo para desabafar o nada e com ele aquela angústia. Aquele peso de angústia oca no meu eco. Busco-me desesperadamente dentro de mim. Procuro o meu eu. Procuro-me em mim. Em cada parte me encontro. Encontro o medo de voltar a mim como me era. Perco-me, então ão ão ão…

Fernanda Tavares

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